14 de abril de 2013

PLUS SIZE OU PLUS PRICE?


A aprisionaram ainda criança, quando, talvez por ignorância, ou maldade, o avô lhe dissera que era inútil ficar se olhando no espelho porque ela era gorda, sendo gorda ninguém nunca iria se interessar por ela, nunca se casaria porque homens não gostavam de mulheres gordas.
Dentro de sua inocência, magoada com as palavras duras, mas, criança demais para as interpretá-las, ela não mensurara no quanto àquela cena, aquele momento a marcariam para o resto de sua vida.
Foram anos lutando contra a rejeição. Para ser aceita na sociedade estudara, muito, lia freneticamente, pois, queria compensar a falta de atrativo físico com o intelectual. Nessa ânsia alguém dissera: você devora os livros para fugir de si mesma, ao que ela concordara, mas, era melhor viajar nas palavras que entrar para o mundo das drogas, da bebida, da depressão.
A adolescência também não fora um período fácil. A menina do espelho não conseguia sair de sua prisão, aquela que o avô tão bem construíra quando essa ainda era criança.
O problema se estendera em sua vida adulta. O problema com o peso a transformara em uma pessoa insegura, carente, arredia, medrosa. Toda pessoa que se aproximava, ou ela a grudava, com medo de perder, ou ela a repelia, com medo de sofrer.
Para sentir-se parte de um todo, para tentar se livrar da prisão, ainda em fase de desenvolvimento tomara remédios fortes, de tarja preta, para que a gordura sumisse e as chaves da prisão se abrissem, mas, como peso é questão mais psicológica que biológica, o problema persistia e, os remédios exerciam apenas a função de adoecê-la, pois, os componentes desses tinham efeitos de drogas sobre sua mente (insônia, boca seca, agitação, euforia, que era momentânea, nervosismo, agressividade, tremedeira, descontrole emocional, etc).
No auge do problema decidira ler dez livros por semana, pois, assim, não pensaria em mais nada, não pensaria em sua dor, em sua “inadequação” social.
Até hoje ficaram flashes de momentos em que o desprezo, a discriminação faziam suas marcas, abriam feridas, que sangram até hoje a cada rejeição.
Só quem passa por esse problema consegue mensurar o que é para uma adolescente ver que seu corpo não se parece com o de suas amigas, que você não faz parte do todo.
Só quem passa por esse problema consegue medir o que é ser rejeitado por algo que, no caso de uma criança, de um adolescente, é maior que sua capacidade de compreensão (uma criança não entende porque come demais, não entende porque um número na balança decide se você será amado ou não, o adolescente, em fase de desenvolvimento, até compreende a rejeição, mas, como está tentando entender o mundo, o que poderia ser fácil de ser resolvido, vira faca de dois gumes, envolto em emoções novas, em sentimentos novos, a tendência  é comer ainda mais).
Só quem passa pelo problema sabe o que é ser invisível, mesmo maquiada, mesmo com uma roupa bonita, mesmo sendo inteligente, mesmo sendo delicada, mesmo sendo gente, mesmo tendo sentimentos.
Só quem passa por esse problema entende profundamente de hipocrisia, mediocridade, falta de respeito, de generosidade (tem pessoas cruéis, que são capazes de massacrar o sentimento de uma pessoa, até mesmo de uma criança, que não cabe dentro de seus conceitos estereotipados).
Após apresentar esse pequeno pedaço de realidade, que não contém nem 10% do que passei me pergunto sobre essa tal tendência Plus Size.
Eu sou a favor da moda, concordo plenamente na democratização da moda. Antes mesmo de eu passar pela cirurgia bariátrica, que para mim tinha o valor de uma chave de ouro, pois, queria muito me libertar da prisão que me colocaram quando criança, já conseguia encontrar roupas bacanas, que me faziam me sentir bem, apesar dos inúmeros quilos, o que eu quero entender não é o movimento, é o que ele esconde.
Eu não acredito, sinceramente, que há tanto descolamento e desinibição nesse movimento, acredito em mercado, porém, isso está longe de ser aceitação.
Uma tendência de mercado não pode ser confundida como remédio para autoestima. As pessoas que estão a ganhar dinheiro com esse mercado não deveria vender a ideia de que se vestindo bem, com roupas adequadas para seu corpo você será aceito nas “rodinhas” sociais, no mercado de trabalho, que nossas cicatrizes serão apagadas só porque agora modelos gordas aparecem nas capas de algumas revistas.
Eu convivo com o problema e conheço centenas de pessoas acima do peso, por mais que elas se dizem resolvidas elas choram sozinhas por não se acharem parte desse universo.
Ao “glamourizar” a obesidade não cairemos no mesmo problema que temos hoje, com adolescentes anoréxicas?
O problema com peso, tanto do excesso desse quanto da falta desse é algo que ultrapassa representação midiática. É cabeça, é cultura.
Eu tenho roupa de marca, eu tenho perfumes importados, tenho diploma universitário, sapatos caros,  mas, nada disso me devolvera  a liberdade que meu avô me tirou, não creio que me ver representada em sites e capas de revistas faria meu problema desaparecer do dia para a noite. É dor de alma, cicatrizado, que roupas não conseguem vestir.
Publicizar, fazer a sociedade engolir um conceito só tornará a situação tolerável, não a fará ser extinta.
Poderia ser proibido difundir ilusão.
Podem dizer que nem todos somos iguais, que é recalque de minha parte, que existe sim mulher gorda bem resolvida. Não generalizo, mas, sou cética e acética (de acidez) e, por isso, volto a afirmar, plus size é tendência de mercado, nada mais,  é como sorriso bonito em propaganda de creme dental, faz parte da estratégia de venda.
As cicatrizes da alma obesa continuarão desnudas.

(imagens do google)
Dedicado a S.C

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