7 de abril de 2013

OS OLHOS DA ALMA.


Estamos na era da estética, do buscar desenfreado pela perfeição física, a perfeição que a mídia diz ser a ideal.
Só o que se vê são mulheres e homens perdendo a essência de ser humano para se enquadrarem dentro do que as revistas só conseguem com muito Photoshop, e, dentro dessa futilidade eu me pergunto: se tivéssemos nascido cegos, se não tivesse sido dado ao ser humano a perfeição do olhar, qual seria nossa visão do outro? Como seria não ter noção de que meu vizinho é careca, que minha vizinha é gorda, que o nariz dela é grande, que os olhos dele são verdes, que a filha deles é anã, que o filho desses tem uma imperfeição física?
No ônibus que eu ia para a faculdade havia uma estudante cega. Quando entrávamos no ônibus, talvez por vontade de se interagir com nosso mundo ela dizia: nossa Lú, como você fica bem de azul. Oi Patrícia, essa blusa rosa é linda. Eu só imagino que ela dizia isso por vontade de fazer parte do todo, mas, ao mesmo tempo, ao saber que ela nunca havia enxergado eu me perguntava qual era a noção de azul que ela tinha, qual era seu conceito de rosa e, como ela conceituava para si mesma a noção de beleza que ela percebia, ou não, nas pessoas.
A vida dela dentro do nosso contexto, de pessoas que enxergam, não deve ser fácil.
Essa pessoa era casada com alguém também deficiente visual e ela falava dele com extremo carinho. Qual foi o parâmetro de beleza que os aproximaram? A questão estética faria alguma diferença dentro do mundo deles? O esposo tocava violão maravilhosamente bem (tocava, pois, ele viera a falecer vítima de câncer há uns cinco anos) trazia para o nosso mundo, dos que enxergam, uma beleza sonora que independia da visão para perceber a sincronia dos acordes. Ela, a esposa, se veste bem. Apesar da falta da visão ela sempre está arrumadinha, mas, foi esse arrumadinha que chamara à atenção dele para ela ou fora algo que não poderíamos explicar com palavras?
Fico intrigada com pessoas que se privam do amor, da companhia das pessoas por ela não caber dentro do seu mundinho esteticamente programado.
Repito aqui um outro texto meu que resumiria o que penso sobre o olhar que deveríamos ter sobre o outro, o reproduzo na íntegra novamente, apesar que alguns de vocês certamente já o tenha lido.
Acho que você me olhou depressa demais. Isso fez você não ver meu sorriso fácil, minhas vitórias, meus medos, deslizes, sonhos, minha dor, minhas cicatrizes (tenho cicatrizes imensas, de amores que se foram, de pedaços de mim que levaram, de momentos que me arrancaram), meus passos, minhas idas e voltas (já estive no fundo do poço, já estive no vale da esperança, já fui no mundo da amargura, fui deitar em braços que me aconchegaram, já estive entrelaçada a pernas que seguiram vários dos meus caminhos, e alguns que se perderam no percurso).
Ao me olhar rápido demais tu não reparaste em minhas sutilezas, na profundidade do meu olhar.
 No olhar rápido não cabe o sorriso contido na alma, não cabe o olhar oculto do desejo.
Quem olha rápido não vê a chama, não sente o delicado movimento dos sussurros.
Quem olha rápido demais não vê as lutas internas, não percebe o cheiro de brisa nas palavras soltas. Quem olha rápido não percebe o intenso, não nota o imenso.
Como podes me resumir? Eu não me caibo na sua síntese. Sou grande, imensidão de oceano, lago profundo, sou planetas, sou deserto, sou relva, sou selva, sou magia, sou cores fortes, noite e dia. Se me resumes perdes meu cheiro, o meu efêmero, meu eterno. Se me olhastes tão depressa como sabe que não cabes em mim, pois, tu desconheces meus vazios, minha finitude.
Se não tivesse me olhado tão depressa veria que sou uma vastidão sem limites.
Quem me olha depressa apenas me olha, não me vê. 
E se você não pudesse enxergar, qual o conceito que você teria de mim, de ti, do outro, do mundo? Qual conceito você teria da beleza das flores? Não seria, nesse caso, o cheiro, a essência, mais importantes que as cores e a textura, o formato?

(Dedicado a S.C).

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